Detesto esse povo que me
manda esquecer. Tô meio murcha porque minha rinite atacou e lá vem o
drama. “Tá triste, né querida? Eu sei, ele te usou, Mas não liga não.
Eles são assim mesmo, são todos iguais. Só estão a fim daquilo lá que
você sabe né. Você deve estar se sentindo péssima, eu sei, mas vai
passar, viu linda?”. É, tô me sentindo péssima, mas é com você
despejando mil e umas frases prontas que viu na internet e usa por aí
como se distribuísse conselhos excelentes. E não fica assim como? Com
esse olho cheio de lágrimas e essa cara de acabada? Eu fico acabada com
qualquer poeira. Qualquer filme me faz chorar. Fico acabada com o calor
que me deixa mole. E esse povo achando que eu tô sofrendo por homem.
Sabe, você sabe, eu odeio poeira. Eu odeio porque poeira me lembra tudo
que é velho. E tudo que é velho me lembra ele. Porque ele é velho. Velho
na minha vida. E eu não gosto de quem pára na estante do meu coração,
junta poeira, atrapalha todo o resto e não serve pra nada. Gosto da
casa, da pele, da vida, do coração limpo. Aliás, vivo muito melhor.
Depois que descobri que tinha alergia a ele, e que tudo que eu tinha que
fazer era limpar esse pó acumulado aqui dentro, ficou tudo mais fácil.
Agora não preciso mais de pessoas infelizes me dando conselhos sobre
como ser feliz. Agora vou mandar você se ferrar em pensamento e
responder que não é nada, é só minha rinite. E me deixa, que eu demoro
demais pra sacudir a poeira. Mas quando vou, passo feito furacão,
arrasto tudo, não penso mais em sorrisos, em vontades, em passado. Me
deixa, que eu tenho meu tempo. Fico anos dando murro em ponta de faca,
depois roubo a faca, te rasgo inteiro, e você só percebe quando começa a
sangrar. Não dou nem meia volta quando querem que eu dê a volta por
cima, mas de repente, o mundo gira, e eu que fui tanto tempo suja, tanto
tempo murcha, tanto tempo alérgica, agora vou ser caçadora. Feito
aquelas faxineiras que não sossegam enquanto não estiver tudo brilhando.
Caçadora, é. Mas sabe do que? Da minha felicidade. Do meu mundo
colorido que eu sempre sonhei. Dos dias de sol que respiro bem e sujeira
nenhuma afeta minha vida. É só esperar, hoje tô entupida,
congestionada, com o peito chiando, com a vida doendo. Amanhã tô
pulando, com a vida saltando dos olhos, com a garganta limpa pra poder
gritar alto que sou feliz. É, sou feliz. E apesar da minha alergia eu
sou alegria. Tá vendo como uma letra faz diferença na vida? É fácil ser
feliz. Basta fazer uma faxina de umas ou outras sujeiras que andam por
aí com pernas, braços, sorrisos e mentiras.
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